“Poderíamos basicamente
dizer que a ficção é um meio
para os seres humanos estenderem-se
além de seus limites.”
Wolfgang Iser
em entrevista ao JB, 5.10.1996.
As afinidades de psicanálise e ficção se encontram
no terreno da fantasia e do sonho. Os motivos e os fantasmas do texto são os do escritor, que por sua vez ganham vida própria a
partir dos motivos e fantasmas do leitor. A livre associação está presente na
construção de um texto, mesmo que o autor não esteja pensando nela, porque as
pulsões passeiam livremente entre as linhas e o desejo marca o ritmo das
frases. Seja falando de coisas sérias, burocráticas, prosaicas, desagradáveis
ou desinteressantes, seja tecendo um texto que ressuma prazer e fruição, o
ficcionista está compondo alguma coisa que se constrói de muitas faces, de
muitos elementos diversos e contraditórios, todos necessários para o resultado
final.
Quando se propõe a construir um edifício bem
planejado, com princípio, meio e fim, no entanto, o escritor pode estar
produzindo por isso um texto monótono, previsível ou mais pobre do que seria de
desejar, porque exerceu uma censura, deixou o superego escrever por ele, não
foi generoso o suficiente e não deixou nada de novo vir à tona, e dificilmente
vai conseguir suscitar muito interesse em seus leitores.
Tela de René Magritte
Os textos de Freud se assemelham muitas vezes a
ficções, pela quantidade de sentidos que eles encerram, às
vezes até contraditórios. O toque romântico com que vemos suas
exposições é circunstancial, uma questão de estilo e de época, mas o conteúdo
de seu pensamento é absolutamente revolucionário e subversivo para os padrões
da sociedade em que ele vivia.